sábado, 5 de março de 2011

RESSENTIMENTOS, MÁGOAS E CULPAS SÃO CAMINHOS NOCIVOS DE RETENÇÃO DA DOR


JORNAL DIÁRIO DA REGIÃO
Escritor por: Gisele Bortoleto
Data: 05/09/2010

O poeta Carlos Drumond de Andrade tinha razão quando disse que a dor é inevitável, mas que o sofrimento é opcional.
Ao longo da vida acumulamos ressentimentos gerados por algo causado por outras pessoas e também culpas por termos provocado sofrimento a alguém. Mas tem uma hora em que isso tudo precisa ser superado para que a vida possa seguir adiante.
A dor tem limite sim, e depende muito de como cada ser humano encara os ressentimentos gerados por sentimentos como mágoa e culpa. Então, chega de chorar. Tudo o que precisamos é aprender a lidar melhor com estas delicadas reações e seguir um caminho mais suave.
A professora Denise Pará Diniz, terapeuta comportamental e coordenadora do Setor de Gerenciamento de Estresse e Qualidade de Vida da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), diz que o problema é que muita gente pensa que resolver ressentimentos é somente resolver com o outro aquilo que está pendente.
Isso até tem de ser feito. Mas, antes, é preciso entender o que de fato lhe fez mal e porque ganhou tamanha dimensão na sua vida, não para ficar perdido numa demanda emocional, mas para buscar o equilíbrio.


Cultive a autoestima


A autoestima é o melhor antídoto contra qualquer tipo de ressentimento. “Você não pode associar tudo de ruim que acontece a partir de outra pessoa, fato ou comportamento”, diz Denise Diniz.
Raiva, mágoa e ressentimentos quase sempre têm origem na falta da autoestima, ou seja, na falta de amor por si mesmo.
Quando valorizamos demasiadamente a opinião dos outros - amigos, colegas, familiares, companheiros - a nosso respeito, estamos nos apoiando em um terreno movediço porque acabamos nos tornando dependentes. Temos de nos valorizar e reconhecer nosso sistema de valores que é o que permite que tenhamos expectativa maior ou menor em relação ao outro.
“Aquele que se ama, se valoriza e valoriza suas capacidades não se magoa tão facilmente”, diz
Denise. “Ele sabe que tem recursos para gerenciar aquilo de alguma forma e não fica tão magoado, raivoso com relação a alguma decepção com colega de trabalho, namorado ou amigo, por exemplo”, completa.
Temos de procurar, na medida que der, desenvolver nossa autoestima. Por mais que a gente insista em culpar os outros, temos de observar que somos nós que estamos dando esse poder a eles.
A psicóloga e psicopedagoga Silvana Parreira de Jesus diz que é necessário digerir, compreender, mudar e trabalhar esses sentimentos, para que busquemos a evolução e novos comportamentos que tenham êxitos futuros. Podemos aprender a usar frases como “Me desculpe”, “Me perdoe”, “Eu errei” ou “Eu não queria magoar você”.
“Quando há o perdão, desculpa verdadeira e aprendizado, é possível ser feliz”, diz Silvana Parreira. É preciso saber que se hoje alguém errou com você, amanhã você pode errar com alguém. É preciso aprender sempre com os seus erros e não com os dos outros.
Os sentimentos negativos fazem adoecer o corpo e a mente. É necessário sempre questioná-los e, com isso, dar espaço para as ideias e novos comportamentos.
A psicóloga Ana Cristina Penteado Lopes, terapeuta cognitivo-comportamental, diz que muitas vezes, como não sabemos lidar com esses sentimentos tão delicados, ficamos paralisados e vamos desperdiçando pelo caminho as chances de ser felizes.
Perder o emprego ou um ente querido são situações que causam dor. É natural e humano que você sofra quando qualquer coisa assim acontece.
O publicitário J.L.S., 28 anos, participou recentemente de um processo seletivo em uma grande empresa e acreditava estar qualificado para vaga, mas não conseguiu. “Tinha certeza de que a vaga seria minha, mas não foi bem assim. Gostaria que me dissessem onde errei”, diz.
Ana Cristina Lopes garante que ele tem duas opções. Ou fica paralisado, remoendo essa frustração pelo resto da vida, ou a maneira como ele fará a leitura da situação vai definir se esse sofrimento terá ou não continuidade. O publicitário pode fazer uma leitura negativa, derrotista, de incompetência ou como um desafio. Do tipo: “Ainda não chegou minha hora e vamos em frente”.
Para a psicóloga norte-americana Louise L. Hay, autora do livro “Você Pode Curar Sua Vida” (Ed. Best Seller), somos totalmente responsáveis por nossas experiências. Ressentimento e culpa são os padrões mais prejudiciais e com eles criamos nossas próprias doenças.
Neste caso, precisamos, além do médico, procurar dentro de nossos corações para descobrirmos quem precisamos perdoar, inclusive a nós mesmos.
Sabemos que ter essa conversa consigo mesmo não é tarefa fácil. Então, imagine quando precisamos conversar com os outros.


Comportamento CORAÇÃO FERIDO


O estudante L.M.N., 23 anos, brigou com o pai e os dois ficaram sem se falar durante três anos. O pai não concordava com a forma segundo ele “inconsequente” com que o filho levava a vida. Em uma noite, há seis meses, recebeu a notícia de que o pai sofrera um acidente de carro. “Fui correndo, morrendo de medo que ele pudesse estar morto sem que eu tivesse a chance de me reconciliar com ele”, diz.
A oportunidade não poderia ter sido melhor. Ambos estavam fragilizados e o medo da morte, no caso do pai, e do remorso, no caso do estudante, permitiu que acertassem as diferenças.
“Acredito que ele continue não concordando comigo, mas pelo menos entendeu que somos pai e filho, nos amamos e isso está acima de tudo”, diz. Os rompimentos podem ter desfecho bom.
A psicóloga Gisele Lelis Viana de Oliveira afirma que a intensidade e duração da vivência de rompimento com alguém importante vão depender de diversos fatores. Inclusive da qualidade dos relacionamentos que a pessoa tem com a família e até mesmo de seu histórico de situações vivenciadas anteriormente.
O processo de separação e de luto é de longo prazo, mas é esperado que a pessoa consiga em algum tempo retomar sua vida. “É comum aparecerem sentimentos como solidão, angústia, sentimentos de culpa, aperto no peito”, diz.
Para seguir em frente, é importante resolver questões pendentes, mágoas, perdoar e ser perdoado.


Lidar com a culpa


A auxiliar administrativa S.C., 35 anos, não consegue se perdoar por ter se envolvido há seis meses com um homem casado. A mulher dele já descobriu o envolvimento. mas ele alega que teme largá-la para não perder o contato com a filha de três anos, assim como já aconteceu com outros dois filhos de um casamento anterior. “Essa situação tem nos causado muito sofrimento porque estamos gostando um do outro de verdade e sempre condenei outras pessoas que saiam com homens casados”, diz.
Além da culpa por estar fazendo uma coisa que socialmente sabe ser errada - uma vez que em nossa sociedade a infidelidade vem carregada de conotações pejorativas - S.C. está magoada também. No fundo, quando a mulher descobriu, ela esperava um desfecho favorável a seu favor, o que não aconteceu até agora. “Também me sinto mal porque sei que, para ela (a esposa), também não deve estar sendo fácil”, afirma.
Como construir um relacionamento com tantos sentimentos negativos?
De acordo com a psicóloga Ana Cristina Lopes, a culpa que ela sente é a reação ao um sentimento de ter prejudicado alguém, ou tentar tomar o lugar de alguém. “Se você faz uma coisa que acha ser errada, você vai se sentir culpada”, diz.
Como a mulher dele descobriu recentemente, o mais indicado é que a auxiliar dê um tempo para que marido e mulher cheguem a um acordo. É preciso também descobrir se ficar com ele será realmente a felicidade dela e deixar claro o que espera.


Conseqüências: Guardar faz mal à saúde


De modo geral, as pessoas costumam remoer a mágoa ou a culpa e reprimir a dor por medo de expor os sentimentos ou de não conseguir colocar para fora toda a angústia que estão sentindo. Mas de acordo com a especialista da Unifesp Denise Pará Diniz, esses sentimentos continuam ali, o tempo todo na cabeça, sem parar, e você não percebe, mas guardá-los faz mal para a mente e para o corpo.
O organismo humano não foi feito para guardar mágoas, culpas ou outro tipo qualquer de sentimento ruim. O corpo e a mente vão ficando pesados à medida em que eles se acumulam e uma hora a panela de pressão explode, como forma de aliviar o sofrimento.
Mas na hora da explosão, a pessoa se sente tão sufocada que sai magoando outras que estão ao seu redor sem perceber. É preciso tempo e paciência para aprender a lidar com os sentimentos sem ferir as pessoas e nem a si mesmo.
Na medida em que vamos acumulando esses sentimentos e damos a ele uma conotação negativa maior do que de fato ele deveria ter, sufocamos nossos limites emocionais. Aí, começam a aparecer os sintomas.
O problema é que todos nós criamos expectativas sobre a vida e não fomos treinados para lidar com as frustrações. Mas quando elas extrapolam este limite (lembre-se que cada um tem o seu) e nos fazem sofrer, significa que alguma coisa está em desequilíbrio e temos de resolver.
A dor emocional se torna física quando a intensidade que damos ao fato que nos magoa chega a interferir na atividade cerebral de modo a dificultar o envio de estímulos nervosos responsáveis pela execução de algumas funções de nosso organismo.
O cérebro deixa de comandar alguma função e o corpo reage sinalizando onde está o problema. Nossos pensamentos são fonte de risco para o estresse que o ser humano pode desenvolver e desencadear doenças. (GB)


Problemas relacionados à dor reprimida


Físicos
Asma, alergias, estresse, hipertensão e, a longo prazo, até mesmo câncer
Psíquicos
Agressividade, ansiedade, irritabilidade, nervosismo
Sociais
Apatia, conflitos domésticos, queda de desempenho no trabalho e tendência ao isolamento
Fontes: Reportagem


Dicas

SE VOCÊ SOFRE DE MÁGOA
  • Analise o que causou o ferimento e reconheça as próprias fragilidades;
  • Avalie se pode ter contribuído para a situação;
  • Aceite que está magoado para depois entender quem causou tal sofrimento. À medida em que você reproduz a mágoa, está permitindo que isso possa continuar atingindo-o do ponto de vista físico, psíquico e emocional;
  • Racionalize essa mágoa;
  • Diminua as expectativas em relação ao outro. O outro só o atinge se você quiser;
  • Cuide das feridas emocionais com delicadeza. A pessoa que se respeita recusa o papel de vítima. E, quando você estiver mais calmo, diga o que realmente causou a ofensa;
  • Exponha seus sentimentos, sem acusar, e escute a outra parte. Isso pode desfazer mal-entendidos e abrir espaço para pedidos de desculpas;
  • Perdoe. Perdoar não é esquecer o que lhe fez mal e sim superar e se libertar daquele sentimento ruim.

SE VOCÊ SOFRE DE CULPA
  • Veja o contexto em que agiu e os fatores que podem atenuar essa situação;
  • Assuma um grau de responsabilidade compatível. Se cometeu um erro grave reconheça e tente repará-lo da maneira mais justa possível. Não minimize nem exagere na compensação;
  • Aprenda a superar, gerencie seu estresse. Senão, tanto seu corpo, seu coração ou sua cabeça serão afetados;
  • O desempenho e produtividade vão ficar cada vez menores;
  • Peça perdão a quem você possa ter atingido. Para isso, não é preciso se humilhar, nem deixar que a outra pessoa o manipule;
  • Perdoe-se. Tente ver as situações difíceis como uma etapa necessária ao seu crescimento pessoal.

EM AMBOS OS CASOS
  • Cultive a autoestima. Este é o melhor antídoto contra qualquer tipo de ressentimento;
  • Ressentimentos quase sempre têm origem na falta da autoestima, ou seja, a falta de amor por si mesmo
  • Dê o justo valor ao outro. Não o valorize demais. Quando valorizamos muito o olhar dos amigos, dos colegas, dos familiares ou dos companheiros acabamos nos tornando dependentes. Por mais que a gente insista em culpar os outros, temos de observar que somos nós que damos esse poder a eles;
  • Valorize-se. Aquele que se ama, se valoriza e valoriza suas capacidades não se magoa tão facilmente.

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